Quando o livro vira vitrine: a ascensão da leitura performática

*Eduardo Cunha 

Hoje, nas redes sociais, não basta mais ler: é preciso ser visto lendo. Esse é o cenário do fenômeno chamado performative reading, ou “leitura performática”, que ganhou destaque em reportagem do O Globo e vem sendo discutido em veículos de vários países. A ideia é simples (e curiosa): exibir livros em fotos, vídeos e cenários cuidadosamente montados, muitas vezes sem que a leitura avance além da primeira página.

De celebridades pop, como Dua Lipa, a personagens de novelas brasileiras, o hábito de mostrar títulos se tornou uma forma de capital simbólico. No Instagram, TikTok e outras plataformas digitais, o livro funciona quase como adereço estético: estantes impecáveis, capas escolhidas com cuidado e até trechos sublinhados que funcionam mais como hashtags visuais do que como reflexão literária.

Pesquisas da USP e análises internacionais mostram que essa prática não é apenas um modismo. Ela reflete uma busca por identidade e aceitação em um ambiente digital competitivo. Artigos como os do Colgate Maroon News, associam o fenômeno à ansiedade de demonstrar status cultural, transformando a leitura em espetáculo público. Já veículos como The Week destacam movimentos como o BookTok, onde determinados livros viralizam mais pelo efeito estético e social do que pela qualidade literária.

Mas há quem enxergue um lado positivo. Publicações como a revista digital Books Are Our Superpower defendem que, mesmo que superficial, essa prática mantém o livro em evidência. Uma foto ou postagem pode despertar a curiosidade de seguidores, incentivar compras e até apresentar novos autores a leitores que talvez nunca os conhecessem. Ou seja: mesmo performática, a leitura ainda conta.

Historicamente, possuir livros sempre esteve ligado ao status social e intelectual. Bibliotecas pessoais eram vitrines de prestígio muito antes da era digital. A novidade é que, nas redes, essa vitrine se multiplica para milhões de pessoas, acelerando tendências e moldando comportamentos.

No fim, a ascensão da leitura performática é um lembrete curioso: os índices de leitura no Brasil continuam em queda, mas o livro jamais deixou de ser um objeto de desejo. A pergunta que fica é se esse desejo vai se limitar à superfície das telas ou se pode se tornar um trampolim para colocar a leitura de volta no centro da vida cultural.

Para editoras e livrarias, o desafio é transformar essa vitrine em um engajamento real. A presença de livros nas fotos de influenciadores pode gerar vendas rápidas, mas também corre o risco de banalizar a experiência literária. O equilíbrio está em aproveitar essa visibilidade como porta de entrada, criando pontes entre estética e conteúdo.

Isso abre espaço para estratégias criativas: clubes de leitura digitais, parcerias com criadores de conteúdo e campanhas que conectem a beleza visual do livro à riqueza de sua narrativa. Se o público já valoriza a imagem do livro, cabe ao mercado editorial transformar “likes” em leitores de fato.

*Eduardo Cunha, Diretor de Negócios na Bookinfo, onde atua diariamente para elevar o nível de adoção de tecnologia no mercado editorial. Lidera iniciativas baseadas em inteligência artificial e dados que modernizam a gestão de catálogo, otimizam vendas e automatizam a reposição de estoque. Também presta consultoria estratégica para editoras, distribuidoras e livrarias, sempre com foco em resultados, eficiência e inovação.

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